sábado, maio 27, 2006

A Miragem do crescimento econômico


Os analistas econômicos têm saudado nas últimas semanas o “vigor” da recuperação americana. Todos indicadores analisados por essas figuras são positivos, sendo exceção à criação de novos postos de trabalho. Como a economia americana é a grande locomotiva, presume-se que os vagões europeus e asiáticos começam a decolar, puxando o resto da economia mundial. Por outro lado, esses mesmos analistas, dizem que a Europa anda resmungando pelos cantos, contra a política americana de desvalorização do dólar para aumentar as exportações e reduzir a ociosidade da sua indústria. Dizem que a inversão de papéis dos EUA, de grande sorvedouro de mercadorias e capitais de todo mundo para país exportador, levará, fatalmente, a retração econômica da Europa e da Ásia, com conseqüências imprevisíveis para os demais Continentes. Para complicar ainda mais, fala-se que o imenso déficit externo dos EUA, só pode ser coberto com os fluxos de capitais advindo dos superávits das exportações européias e asiáticas, que de quebra ajuda a inflar a bolha de ações, imóveis e títulos, alimentando o efeito riqueza e o mercado interno americano.

Desse imbróglio podemos tirar algumas conclusões. Se a indústria americana de bens de consumo encontra-se ociosa e carente de novos investimentos apesar dos enormes subsídios governamentais, o aumento das exportações e o crescimento da industria armamentista em torno de 45% com a guerra do Iraque, aparentemente são os responsáveis pelo crescimento da economia americana nos últimos trimestres. Talvez, nesse momento, o consumo interno não tenha o papel que lhes querem atribuir alguns desses analistas, e um indicador importante para isso é que as taxas de emprego continuam de ladeira abaixo. Uma outra questão: o consumo americano, sustentado pelo capital fictício depende, em grande parte, dos fluxos de capitais europeus e principalmente asiáticos, utilizados nas compras de notas do tesouro e outros ativos. Ora, uma redução dos superávits dessas regiões em função do aumento das exportações e redução das importações pelo EUA, inibe os fluxos desses capitais e, conseqüentemente, os gastos dos consumidores, repercutindo negativamente na situação interna americana e na cobertura déficit comercial. Quando se mexe de um lado o desequilíbrio esparrama-se para os outros, rápido e perigosamente. Limitando uma fonte importante de combustível do consumo interno e de equilíbrio nas contas, a locomotiva americana pode parar bruscamente. Os vagões europeus e asiáticos, emperrados há um bom tempo, sentirão o tranco e correm o risco de sair dos trilhos.

Na busca de um crescimento a qualquer preço e com a proximidade das eleições, o governo dos Estados Unidos tem pressionado fortemente Pequim e outros países, para que tomem medidas que possam valorizar suas moedas, reduzindo com isso, as exportações para o mercado americano. O obstáculo está no fato de que a quase totalidades das empresas exportadoras instaladas na China são americanas e japonesas que “terceirizaram” parte de sua produção pelo mundo afora como política de redução de custos, forçadas pela predadora concorrência global. Medidas como essas poderiam afetar os capitais que daí estão fluindo para ativos americanos, agravando mais ainda a situação interna e a administração do déficit comercial.


Fala-se em profundo endividamento das famílias e das empresas estadunidense. A circunstância em que se encontra o governo que para cobrir o déficit fiscal do setor público de mais 4%, resultante dos cortes de impostos beneficiando os ricos, da freada na economia e dos gastos para movimentar a colossal máquina de guerra, deve elevar o endividamento aos céus. Li recentemente um resumo do estudo de um economista norte-americano, que mostra que os preços das ações estão bem acima dos lucros e que relação histórica preço/lucro era de 14 para 1 para as 500 maiores empresas americanas. Em 2003 a média dessa relação atingiu 33 para 1, chegando a mais de 180 para 1 em algumas empresas mais audaciosas. Ou seja, a bolha financeira continua se expandindo tanto quanto o Universo, inflada pela crise do valor. O que até agora vazou do seu conteúdo etéreo com a queda das ações, foi uma simples brisa do capital fictício. Haverá choros e ranger de dentes quando em sua contração, os ventos ao escaparem da bolha atingirem a velocidade dos tufões, desmanchando tudo que na terra ou no mar encontrava-se aparentemente sólido.


Rall

07.09.2003


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